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  1. Timidez

    08/06/2009

    por Medéia

    Você passou mais uma vez por mim nos corredores da escola. Creio que vi seu olhar encontrar o meu, mas não tenho certeza pois abaixei a cabeça um tanto tímido. Você é realmente a garota mais linda da escola.
    Com fones no ouvido posso me concentrar apenas em você, ouvindo a música que elegi para o meu amor platônico.

    Toda vez que te olho
    Crio um romance
    Te persigo, mudo
    todos instantes

    Eu me lembro da aula prática de química quando a professora nos colocou juntos para realizar um experimento. Não me lembro nem mesmo das palavras que falei. Gaguejei muito com certeza e falei bobagens. Mas lembro seu sorriso branco e seus olhos verdes. O efeito foi o mesmo do fone de meu Ipod, e eu escutava apenas a trilha sonora que elegi para nós. Nem mesmo percebi a professora me chamando.
    Falo pouco pois não
    sou de dar indiretas
    Me arrependo do que digo
    em frases incertas

    Já são meses lhe olhando, lhe admirando, lhe amando. Duas vezes estive perto de me declarar. A primeira foi naquele dia de bagunça geral na escola, quando todos estavam ajudando na arrumação da festa de São João. Eu tinha uma carta na mão e logo ali estava o seu material. Bastava colocar entre as folhas do livro de português ou do seu caderno da Pucca. Mas tive medo de ser visto.
    Se eu tento ser direto, o medo me ataca
    sem poder nada fazer
    Sei que tento me vencer e acabar com a mudez
    Quando eu chego perto, tudo esqueço
    e não tenho vez

    A segunda vez foi na própria festa de São João. Mandar prender você na cadeia e mandar me prender também foi o máximo que eu podia imaginar. Fantasiei você, linda, com seus loiros cachos, na escura cadeia feita de bambus ao lado do vestiário da escola. Só nós dois nos olhando e eu nem mesmo precisaria falar nada. Mas não imaginei que cadeias de festa fossem tão cheias e que nem mesmo conseguiria te ver.
    Me consolo, foi errado o momento, talvez
    Mas na verdade, nada esconde essa minha timidez
    Eu carrego comigo a grande agonia
    De pensar em você, toda hora do dia
    Eu carrego comigo, a grande agonia
    Na verdade nada esconde essa minha timidez
    Na verdade nada esconde essa minha timidez
    Então desisti. Não desisti de meu amor por você, mas de tentar me aproximar e confessar este entusiasmo juvenil que tomou conta de mim. Talvez passe com o tempo, talvez não. Enquanto isso, continuo ouvindo o meu mundo pelo fone de meu Ipod e escrevendo este diário.
    Talvez escreva um poema
    No qual grite o seu nome
    Nem sei se vale a pena
    Talvez só telefone
    Eu me ensaio, mas nada sai
    O seu rosto me distrai
    Cada dia que passa descubro novas formas de ver você sem dar bandeira. Escondido atrás de árvores ou paredes, eu vejo você passar, sorrindo e brincando com suas amigas. Uma vez eu estava tão perto de você que tive que me segurar para não lhe ajudar quando seu material caiu no chão. Algumas vezes penso que você percebe quando estou te olhando. Você olha ao redor como que procurando alguém e não encontra, mas acho que esta é mais uma fantasia minha, ao som de nossa trilha.

    E, como um raio,
    eu encubro , eu disfarço
    eu camuflo, eu desfaço
    Eu respiro bem fundo
    Hoje digo pro mundo
    Resolvi sair disfarçado hoje de casa. Não muito disfarçado. Só coloquei um chapéu de pescaria, um casaco enorme do meu pai e troquei de mochila com meu irmão. Talvez assim consiga chegar mais perto de você, sem você me perceber. No intervalo das aulas você estava ali no banco, de rabo de cavalo e sorriso no rosto. Calça jeans lavada e uma blusinha verde que combina com seus olhos. Você ria de algo que uma das garotas dizia e de repente você parou. Olhou ao redor novamente e acho até que me viu. Também, estúpido, é claro que estou chamando a atenção com este monte de roupa estranha.
    Você então saiu do grupo e sumiu entre os corredores. Não tive coragem de seguí-la. Estou muito chamativo hoje e você poderia perceber. O que seria então de...

    Mudei rosto e imagem
    Mas você me sorriu
    Lá se foi minha coragem
    Você me inibiu

    - Oi Gustavo! O que você faz aqui com esta roupa estranha? – ela disse com um sorriso divertido, enquanto olhava o garoto de cima até embaixo fixando-se no diário e no Ipod.
    Ele nem mesmo respondeu.
    - Posso ouvir? – ela perguntou apontando o Ipod e já puxando um dos fones de sua orelha.
    Ele continuava mudo, estático, sem conseguir se mexer.
    - Adoro Biquini Cavadão também. Posso ver o que está escrevendo aí? – novamente ela perguntava enquanto agia, tirando o diário de suas mãos.
    E ele tinha certeza que isso não era um sonho, era um pesadelo. O pesadelo de todo garoto tímido.

  2. 6 comentários:

    1. Lori disse...

      Amei o modo como escreveu o seu texto, me lembrou muito o tempo da escola....parabéns!!!beijokas elis!!!

    2. Anônimo disse...

      Também achei maravilhosa a forma como escreveu.
      Parabéns :)
      Bjos,
      Ly

    3. Leitura Nossa disse...

      Nossa, só de lembrar esses amores platônicos da fase escolar me dá arrepios...
      Muito bom!!

      beijos,
      Dé...

    4. lili disse...

      Nossa, esses amores platônicos escolares, quem nunca passou por eles? Lindo!!!
      Parabéns Medéia e a música é do meu tempo :) Perfeito!!

      Bjssss
      Lili

    5. Vivi disse...

      Sim, Medéia, a história ficou jóia e arrisco a dizer que nem precisava da letra da música intercalada porque é nítido o quanto texto se apropriou do tema e da música em questão. O contexto adolescente também foi bem abordado, no que diz respeito ao uso da linguagem das próprias imagens que fazem parte desse universo. Valeu, garotinha!

      Beijocas

    6. disse...

      Amores platônicos. Quem nunca passou por situações como a relatada em seu texto nos tempos de escola?
      Gostei muito da escolha da trilha sonora.
      Alías, casou perfeitamente com o texto. Tão perfeito que faço coro a fala de Vivi quando ela diz que a letra não precisava ficar intercalada na história.
      Já fica subtendida a timidez do garoto em se aproximar do seu ideal de garota perfeita.
      Parabéns, Medeia!!