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  1. Como reza a lenda

    11/03/2008

    “O meu saci é um moleque brincalhão, sim! Mas, não é aquele ser maligno como reza a lenda contada pelos meus avós. Ele também não é pretinho. O meu Pererê é azul e com a sua carapuça mágica pode aparecer do meu lado e brincar comigo todas as noites. Hoje mesmo, brincamos de pique-esconde. Ele me emprestou sua carapuça e eu me tornei invisível. Mas aí, mamãe entrou no quarto e ele sumiu.

    Dia desses, a professora pediu que desenhássemos o Chibamba. Desenhei-o com vestes de flores. Sabe o que ela me disse? Que o Chibamba é um bicho feio, uma espécie de fantasma criado para assustar crianças em seus pesadelos noturnos, principalmente as malcriadas, teimosas e choronas. Anda coberto com longa esteira de folhas de bananeira, ronca como um porco e dança compassadamente enquanto caminha; às vezes gira. Cruzes!!!

    Então se eu chorar ou fizer alguma arte ou teimar com a mamãe, Chibamba vem me pegar? Vem! E veio. E sabe o que eu disse para ele quando apareceu no meu quarto? Que coisa feia, Chibamba! Assustar menininhas como eu? Isso não se faz. Ele chorou e me disse que não era ruim. Que gostava de brincar, mas as crianças corriam de medo dele. Brincamos a noite toda de contar estrelas.

    Conhece a Cuca? Não, não é aquela do sítio. Lobato que me desculpe, mas minha Cuca é linda! Quando entrou em meu quarto e disse quem era quase não acreditei. Pois nada tinha a ver com aquele ser monstruoso: velha, feia, enrugada, cabelos assanhados, corcunda. Parecia uma índia com longos cabelos pretos como aquele líquido que jorra da terra, não lembro o nome agora, mas mamãe deve saber. Ela sabe.

    Nossa! Já são dez horas da noite!? Como está tarde! Se eu não dormir o bicho-papão vem me pegar. Eu particularmente não acredito nisso. Mas deixo “eles” pensarem que acredito. Tudo para não deixá-los tristes. Preparo a minha melhor cara de menininha assustada-apavorada-com-medo-de bicho-papão. Porque os adultos têm a mania de achar que não criamos nossas próprias estórias? Porque não nos deixam imaginar, inventar, sonhar?Vou contar-lhes um segredo: Reza a lenda que gente grande não sabe ser criança.....

    Mas essa estória eu conto depois. Agora vou dormir. Durmam com as Iaras, Sacis, e Cucas.....Boa Noite!"

    Rê Lima
    ®Todos os direitos reservados

  2. Por: Cristiane Costa


    Emanuel era um homem do mundo, dono de um coração livre e independente. Quando jovem vivia em busca de novas experiências e muita emoção. Desde pequeno, nunca acreditou em nada que seus olhos não pudessem ver. Era um contador de piadas talentoso e um incrédulo convicto. Era um homem simples e até um tanto rude.
    Os anos e a paixão por Angela fizeram com que o coração de Emanuel se acalmasse e acabasse por fixar raízes na cidade. Mas os anos que passaram não conseguiram fazer com que Emanuel acreditasse nas histórias que ouvia, acreditava que tudo era fruto da imaginação dos narradores e as lendas eram invenções para assustar criancinhas e fazê-las mais obedientes.

    Do outro lado da cidade vivia Fabrício. Indiferente ao calor de 37ºC, Fabrício diariamente vestia, impecavelmente, seu traje social, a camisa sempre dobrada acima dos pulsos, exibindo o vistoso relógio de uma marca famosa. Sempre educado, cumprimentava e sorria a todos que encontrava.

    Fabrício era um homem fabuloso, com mais de 30 anos, era alto, cabelos negros e fartos, olhos verdes e um corpo muito bem definido, daqueles obtidos por horas na academia. Os olhares femininos normalmente se dirigiam a ele. Era formado em engenharia e proprietário de uma empresa especializada em auditoria na área de aviação. Devido a profissão viajava pelo menos uma vez por mês, durante uma semana. Namorava Beatriz a mais ou menos um ano. Fabrício era o mais perfeito cavalheiro. Um espécime raro. Embarcou na quinta-feira e tinha retorno programado para o sábado seguinte, para a profunda infelicidade de Beatriz que ficaria uma semana sem vê-lo.

    Emanuel estava trabalhando a mais de um ano no transporte de cana-de-açúcar, um emprego que simpatizava pois não tinha que aturar um chefe chato pegando no seu pé. Fazia o turno da noite, dirigindo seu velho caminhão. Como em todas as noites se dirigia até o campo, onde a máquina fazia o carregamento do caminhão. Enquanto aguardava o carregamento viu um vulto passando entre as canas que ainda não tinham sido cortadas, um cachorro grande que possivelmente tinha sido abandonado pelo dono, o que era muito comum nestas áreas rurais. A lua cheia, mesmo em sua última noite, iluminava o campo.

    Despediu-se dos outros motoristas que aguardavam o carregamento e pegou a estrada de terra que levava a cidade onde ficava a Usina. Ouvia uma estação de rádio local, cantarolando feliz quando percebeu pelo retrovisor o imenso vulto negro que se movia rapidamente tentando alcançar o caminhão. Foi o tempo de piscar os olhos e o mesmo havia desaparecido. Por um instante Emanuel pensou estar ficando louco, pois o vulto que viu lembrava muito o que vira no meio do canavial.

    Subitamente ouviu um barulho na lateral da cabina e ao se virar ficou cara a cara com aquele animal, que lembrava um lobo mas era muito maior que o convencional, com longa pelagem negra, olhar cortante e avermelhado, que estava apoiado no estribo do caminhão. Ao mesmo tempo em que o animal tentou agarrar Emanuel, este conseguiu desvencilhar-se do ataque e escorregou para o lado do passageiro.

    Desesperado Emanuel segurava o volante com uma mão, acelerava com um pé e com o outro tentava, sem sucesso, levantar o vidro que para sua sorte não estava completamente aberto. O animal estava enlouquecido. Totalmente arrebatado, Emanuel começou a jogar o caminhão de um lado para outro, tocando o barranco com a esperança de que o animal se assustasse ou se ferisse, mas tudo em vão. Se esquivava dos ataques da fera agora ainda mais raivosa, aquelas unhas e presas enormes e afiadas buscavam a tenra carne de Emanuel, que chutava e socava o grande lobo. Aquele animal era muito grande e forte, naquele instante Emanuel teve certeza que aquilo era um Lobisomem.

    Não se sabe quanto tempo a luta entre o homem e a fera durou, até que o grande lobo saltasse do veículo e desaparecesse em meio ao canavial. Emanuel ao chegar na Usina, branco como um papel, em um ato que muitos julgaram ser uma crise devido ao “stress”, entregou a chave do caminhão, que estava com a lateral amassada e a pintura riscada a um outro motorista que aguardava o descarregamento na Usina e nunca mais voltou a trabalhar no campo à noite.

    Depois do ataque do Lobisomem, Emanuel começou a crer que se uma lenda existe, algum acontecimento deu origem a ela. Passou a ter muito respeito, pois agora ele havia vivenciado e felizmente sobrevivido ao ataque de um Lobisomem, personagem que até então em sua vida não passava de uma lenda.

    O dia começava a surgir quando Fabrício, do outro lado da cidade, tocou a campainha da casa de Beatriz. Esta quase desmaiou ao ver o estado em que se encontrava seu belo amado. Ele estava todo sujo, com as roupas rasgadas, cheio de arranhões e hematomas. Parecia que tinha participado de uma luta de boxe com alguém muito mais forte que ele a noite inteira; os joelhos e cotovelos estavam escoriados e sangravam. Feliz por estar vivo, Fabrício abraçou a amada e começou a lhe contar os detalhes do sequestro relâmpago do qual foi vítima ao chegar na cidade. Apesar de muito cansado relatou com muito cuidado cada momento vivido. Beatriz ficou horrorizada com a crueldade e insanidade do assaltante, que enquanto agredia Fabrício com socos e pontapés ainda dirigia um veículo em uma estrada de terra.

    Depois de contar a Beatriz tudo o que lhe aconteceu, Fabrício prometeu descansar e não viajar, pelo menos não durante as próximas três semanas.
    ®Todos os direitos reservados

  3. por Medéia

    “Quase mais antiga que a humanidade, uma velha lenda dizia que os Deuses separaram em dois. Em sua testa ela está e ele a reconhecerá”.

    Pesado e quente era o clima em Assuan. Nefer-Hat-Aru, sonolenta, abanava-se deitada sob uma gigantesca sombra artificial feita de papiro e bambus. Algumas de suas escravas núbias, reluzentes sob o escaldante sol, portavam abanadores feitos de penas de aves que realizavam um movimento ondulatório cadenciado, criando uma pequena brisa para sua ama.

    Ao lado o Nilo corria, como lava quente descendo a encosta de um vulcão, cintilante e sereno. Pequenos barcos levavam comerciantes enrolados em mantos alvos, que refletiam o sol como um espelho. As mulheres que por ali circulavam, exibiam o busto nu queimado pelo sol, os cabelos trançados ou escondidos por perucas grossas, saiotes do mais puro linho e pouca maquiagem no rosto devido ao sol quente que castigava a tão amada Khemi.

    Hat-Aru era muito jovem, tendo saído de sua primeira lua vermelha há pouco tempo, e estava completamente entediada de sua jovem vida de nobre. Tuina sua mais antiga escrava, sua segunda mãe e confidente, voltava com seu suco de damascos e lhe sorria.

    - Ainda aborrecida com este tempo quente, Hat-Aru? Posso distraí-la contando histórias de minha terra.

    Só se for a lenda dos amantes, Tuina. – disse animada a garota.

    - Novamente ama? Você realmente gosta desta história.

    - Fico pensando se algum dia encontrarei aquele que amo. Se o sinal em sua testa me mostrará o amor e acabará com meu enfado.

    Neste momento, um jovem escravo correndo, aproximou-se da jovem ama.

    - Senhora, seu pai, meu amo, acaba de aportar com seu barco.

    A garota, esquecendo as boas maneiras que uma nobre deveria ter, saltou e correu em direção ao porto, fazendo com que suas escravas a seguissem. Apenas Tuina, devido a idade, manteve seu ritmo lento até o porto.
    ---
    O barco de Merkeset não era grandioso, mas era tido como o mais rápido do reino. O Senhor Merkeset era ainda jovem e belo, de porte alto e vigoroso, pele adamascada, olhos da cor da folha do papiro. Levava no peito um belo colar de lápis-lazuli dado por sua falecida esposa Tyi. Vestia um manto branco que o protegia do sol escaldante. Estava dando ordens para descarregar os novos escravos eunucos que comprara quando ouviu sua filha Hat-Aru lhe chamando. Correndo ela se aproximou do barco. Realmente era difícil ensinar boas maneiras àquela garota, mas ele a amava muito por isso permitia seus disparates.

    Hat-Aru subiu ao barco correndo e antes de chegar ao seu pai e abraçá-lo esbarrou com o grupo de novos escravos eunucos que Merkeset trazia. Corria tanto que o impacto com um dos escravos quase lhe derrubou. Se não fosse o próprio escravo segurá-la, Hat-Aru teria caído ao chão, ou pior, poderia ter sido derrubada pela amurada.

    Um grande e forte servo de seu pai já levantava o chicote para bater no jovem escravo por se atrever a pôr as mãos em sua ama, quando Merkeset o impediu com um grito.

    Hat-Aru ainda tonta pelo impacto olhou para cima e encontrou um belo e jovem rosto masculino a olhando preocupado. Nariz reto e boca cheia, queixo firme e liso, olhos amendoados e amarelos e um pequeno sinal tatuado na testa. Quando seus olhos se encontraram os dois pareciam estar em outro mundo. Hat-Aru só percebeu seu pai lhe falando quando ele a tocou.

    - Você está bem, minha filha? - um preocupado Merkeset a segurava agora.

    - Sim, meu pai, eu não devia ter corrido, mas sua chegada me alegrou. Só fiquei um pouco tonta com a batida. – aninhando-se nos braços de seu pai, a garota ainda olhava o jovem escravo.

    - Como é seu nome, jovem escravo? – perguntou Merkeset ao rapaz.

    - Nimmur, senhor. E peço desculpas por tocar sua filha.

    - Não se preocupe rapaz, você na verdade a salvou de cair do barco. – Encarando Hat-Aru, perguntou então: - O que acha de ganhar como presente este eunuco, minha filha?

    O olhar de surpresa da garota não se devia ao presente que o pai lhe dava, estava acostumada com eles, mas sim ao fato de Nimmur ser eunuco. Como podia não ter as feições andróginas dos eunucos? Como podia exalar masculinidade quando não a possuía?

    Apenas Tuina, que havia chegado depois em seu passo lento, pode ver nos olhos dos dois jovens o que nem mesmo eles ainda queriam cogitar: o desejo. E isto a preocupava muito.
    ---
    Mais tarde, a sós em seu quarto com Tuina lhe despindo para sua ablução, Hat-Aru ainda não conseguia parar de pensar em Nimmur que estava postado do lado de fora de seus aposentos como guardião.

    Distraidamente pergunta a Tuina: - O que significa aquela tatuagem na testa de Nimmur?
    A escrava que já tinha um olhar preocupado e pensativo olhou sua amada senhora com pena e horror. Mas por não conseguir mentir para ela lhe disse: - Não há nenhuma tatuagem sobre a testa de Nimmur, senhora.

    - Como não? É como um pássaro e se encontra bem no meio... Não! – A verdade havia lhe fulminado como um raio. – Não pode ser, Tuina. Você está brincando comigo. A lenda não era real, me diga que não. Ele não pode estar destinado a mim.

    - Infelizmente, querida, eu acredito que sim.

    - Mas se assim for, ele também deve ver a marca em minha testa.

    - Provavelmente senhora.

    - Chame Nimmur aqui, Tuina. Quero que ele me diga se vê a marca.

    Enquanto Hat-Aru se cobria com um manto finíssimo que apenas lhe deixava ainda mais bela, Tuina ia até a porta dos aposentos chamar Nimmur. O rapaz entrou de cabeça e olhos baixos, mas com um porte altivo, como um guerreiro.

    - Olhe para mim, escravo. – disse Hat-Aru. – E me diga o que vê em minha testa.

    O rapaz confuso levantou os olhos para sua nova e bela ama. Um rosto lindo era o que ele via, e no meio de sua testa um pássaro pintado.

    - Um pássaro, senhora. – abaixou os olhos novamente.

    Choque era o que se via no olhar da garota. E Tuina, que a tudo assistia, já sabendo do que estava por vir, deixou correr lágrimas em seus olhos pelo amor impossível de sua senhora.

    - Saiam os dois daqui agora mesmo. – gritou Hat-Aru. – Preciso ficar só.

    Os escravos saíram enquanto Hat-Aru pensava. Precisava do consolo da Grande Ísis. Ela não podia amar um escravo, muito menos um eunuco. Como isto era possível? Só podia ser uma grande brincadeira de Seth, o deus maligno.

    Nimmur saiu do quarto de Hat-Aru com Tuina e ao parar do lado de fora, a velha escrava o pegou pelo braço e o levou a ala dos servos. Chamou outro eunuco para guardar a porta de sua ama e continuou levanto o jovem pelo braço até seus próprios aposentos. Lá ela lhe contou a lenda, e porque somente ele via a marca na testa de Hat-Aru, assim como ela a via nele.

    Enquanto Nimmur tentava entender seus sentimentos, a senhora Nefer-Hat-Aru pulava a janela de seu quarto e se dirigia ao pequeno templo dedicado à Ísis, dentro de seu palácio, próximo ao lago artificial criado para o banho dos senhores da casa.

    Pedras brancas se erguiam majestosas no templo de linhas simples mas virtuosas. Lá dentro uma chama se mantinha acesa para iluminar a estátua da Deusa e Mãe Ísis. Hat-Aru aproximou-se e ajoelhada pediu a Deusa que a auxiliasse, iluminasse seu caminho e lhe mostrasse o que devia fazer. Assim, a primeira hora a encontrou, exausta de orar durante a noite, dormindo sobre os degraus que levavam a imagem.

    Tuina passou a noite conversando com Nimmur, contando-lhe sobre sua Hat-Aru e ouvindo a história do rapaz. E descobriu algo que poderia chocar o seu Senhor Merkeset, e fazê-lo mandar açoitar o rapaz. Prometeu não contar a ninguém, nem mesmo a sua senhora, para evitar que ela tivesse esperanças no seu amor. Pediu a ele que não encorajasse sua senhora e que se mantivesse distante. Foi ao quarto de Hat-Aru para vê-la e não a encontrou.

    Nimmur saiu da ala dos escravos e andando foi parar justamente em frente ao templo. Atraído por uma força maior que ele, adentrou as colunas e viu a jovem dormindo sobre os degraus. Era uma imagem etérea e linda. Sabia que devia ir embora, mas não conseguia se mexer. Pareceram horas, mas talvez fossem minutos. Hat-Aru foi acordada pelo olhar de Nimmur. E ao virar para ele e ver transbordar amor em seus olhos, soube o que devia fazer. Correu para seus braços e ofereceu seus lábios para um beijo. Nimmur a esperara toda vida. Abraçou-a e beijou-a. Fundidos neste abraço, senhora e escravo viveram sua paixão impossível. Hat-Aru teve instantes de surpresa ao descobrir o segredo de Nimmur: ele não era um eunuco.

    Entre juras de amor e intimidades o casal passou ali a noite. E adormeceram cansados da paixão que os consumiu. Quando a terceira hora chegou, as sacerdotisas vieram ao templo e descobriram os amantes abraçados, dormindo no piso frio, cobertos apenas pelo manto fino de Hat-Aru. Seus gritos atraíram os guardas que levaram Nimmur imediatamente à presença de Merkeset. Enquanto as sacerdotisas carregavam Hat-Aru para seu quarto. Nem mesmo Tuina pode entrar no quarto de sua senhora para consolá-la.

    Merkeset magoado e desolado culpava o rapaz pelo ocorrido. Descobrir que o rapaz não era eunuco e que se aproveitara de sua filha o deixara com raiva. Mandou amarrarem Nimmur com braços e pernas abertos no átrio e cortar o que já deveria ter sido cortado dele. Deixando-o então para morrer esvaindo-se em sangue. Não quis falar com sua filha e ordenou que a mantivessem trancada no quarto durante todo aquele dia, sem comida ou bebida. Quem agora iria querer sua princesa, sem o selo da sua virgindade, com a marca de ter se deitado com um escravo?

    Em seu quarto Hat-Aru chorava copiosamente e chamava o nome de Nimmur. Ela mais sentiu do que ouviu o grito de seu amado. E percebeu a vida se esvaindo do corpo dele. Seus soluços sacudiam seu frágil corpo e cortaram o coração de Tuina, que não podia entrar em seus aposentos.

    E assim passou-se um dia...

    Quando permitiram Tuina entrar no quarto de sua ama, para lavá-la, alimentá-la e confortá-la, o dia nascia novamente, e a velha escrava abriu a porta apreensiva, pois parara de ouvir seus soluços há muito tempo. Para sua surpresa, Hat-Aru não se encontrava em lugar algum. Sobre a cama apenas um pequeno pássaro branco parecia fitá-la. Ao se mexer, Tuina espantou o pássaro que voou pela janela. Instintivamente, Tuina foi até a janela. Lá embaixo, guardas garantiam que sua ama não fugira por ali novamente; lá em cima, recortado contra as nuvens cinzas do dia que nascia nublado, o pássaro que voara, abria suas asas livres. Um outro pássaro, maior e escuro vindo não se sabe de onde, juntou-se ao pequeno pássaro e juntos sumiram no horizonte.

    Não foi surpresa alguma para Tuina descobrir que o corpo do jovem Nimmur não estava mais amarrado no átrio. Apenas seu sangue permanecia manchando o chão claro. Por muitos anos, Merseket mandou procurar o escravo fugido e sua filha, mas sem sucesso algum.

    Esta era mais uma lenda para Tuina contar à próxima senhora que fosse servir, pois Nefer-Hat-Aru e Nimmur com certeza estavam vivendo no outro mundo o seu único e verdadeiro amor.

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  4. As Aventuras de Tininha e Casé na Terra da Espinhela Caída
    Episódio: ‘ Tininha e a Bruxa Zizi – A Futura Madame da Múrcia’

    Por Fernanda Soares

    Na terra da Espinhela Caída tudo vive ao avesso. Tininha a menina disléxica se perde de Casé o seu amiguinho míupe metendo-se na maior confusão. Tudo porque caiu no buraco das Letras Impossíveis – As mega espiães das crianças que não gostam de ler.

    Depois de tanto cair, Tininha se depara com um grande casulo. Era a casa da aranha desesperada. Ela gritou e gritou e gritou até Tininha compreender que aquele lado da Espinhela era mais caída do que ela imaginava.

    Caminhou muitas horas e quando já estava cansada, deparou-se com uma imensa folha que tomava sol na beira do rio. Quando se aproximou, a folha tentou fugir e Tininha a alcançou forçando-a a levá-la para o outro lado. A folha então, depois de muito alertá-la sobre os perigos do lado de lá a transportou.

    Chegando do outro lado, a menina disléxica se depara com a mata mais fechada que já viu em toda sua vida. Seu estômago roncou tão alto que os esquilos que por lá transitavam se assustaram e acabaram caindo no buraco do tatu. Tininha só não sabia dizer se estava com fome, medo ou dor de barriga de tanto comer o doce da vovó. Continuou sua caminhada mata adentro, pois tinha certeza que em terras como aquela, com certeza por ali alguém habitava. Tininha estava certa. Aquela floresta, aquelas habitações e todo aquele reino pertenciam a malévola Bruxa Zizi – A Futura Madame da Múrcia. Rezava a lenda que a Bruxa Zizi vinha de uma família de Sacerdotisas do mal e que por um feitiço mau feito havia caído na Múrcia e de lá transitado para as Terras da Espinhela Caída. Por muitas eras ela havia tentado tomar a Espinhela com intenção de unificar a Múrcia, terra de seu noivo ‘O Marquês Empruado’. Com muito esforço e ajuda de muitos amigos, o Conde Espinhoso havia conseguido banir Zizi para a Floresta do Mato sem Cachorro. E lá estava Tininha no reino da Dona Bruxilda Zizi. Ela apenas se preocupava se o termo bruxa significava algo mesmo ou não passava de brincadeira.

    A menina se aproximou de uma tapera e lá de dentro escutou alguém praguejar. Se aproximando, pode perceber que o morador era tão pequeno quanto ela. Tentou chamar e depois de muito estardalhaço foi atendida por um menininho muito sujinho. Esse menino explicou-lhe que ali não era como a Espinhela, que na Floresta do Mato sem Cachorro as pessoas não eram felizes mesmo que lá as coisas não fossem do avesso. Lá era tudo nos conformes, mas as pessoas viviam tristes, sujas, com fome e que o pouco que conseguiam tinham que pagar para Zizi, a Bruxa. Tininha ficou tão revoltada que até esqueceu que precisava de um caminho para voltar a Espinhela Caída.

    Refez-se da fome que estava sentindo com algumas raízes que as formigas e os esquilos haviam a ensinado tirar da terra, despediu-se do menino e seguiu floresta a baixo. No caminho, Tininha sentiu falta de Casé e lamentou a brincadeira dos dois no buraco das Letras Impossíveis. Se elas descobrissem que eles andaram mexendo em seus equipamentos ultra-secretos estavam fritos.

    Conforme andava, se deparava com alguém e escutava sua história, mais se revoltava. Estava doida para ver essa tal de Bruxa Zizi.

    Mal sabia ela, que a megera acompanhava todos os seus passos pelo junkebox que havia comprado no mercadomagico.com e que a cada passo em suas terras, o aparelho repetia em música tudo que ela estava fazendo.

    Música vai e música vem. Tininha chegou ao centro da Floresta e se espantou com os avanços tecnológicos que a Bruxa Zizi havia colocado ali. Taperas com aparelhos de som e comunicação, relógios avançados e toda a sorte de quinquilharias mágicas que se podia imaginar.

    De fato, era tudo muito estranho. Não se via ninguém feliz e tudo parecia tão sujo.

    Nesse meio tempo, um bebezinho se aproximou e falou que estava presa a mando da Madame Bruxa. Tininha primeiro pensou em rir. Quem em sã consciência era preso por um bebê? Só se deparou com a verdade quando apareceram mais bebês e estes a escoltaram. Tininha ia correr, mas alguém sussurrou lá de dentro que não fizesse isso, porque a fralda dos bebês tinha um poderoso veneno de causar nojo.

    Caminhou calada até o interior do castelo de Zizi. Tinha que arrumar um jeito de sair daquele lugar e libertar as pessoas da floresta. Só não sabia como!

    Uma escuridão tomava conta do recinto em que Tininha foi posta, quer dizer, foi trazida calmamente por carcereiros de fraldas. Ela estava com um humor daqueles! Como podia ser pega por situação tão ridícula? Afinal, Tininha a menina disléxica era famosa em desvendar casos com seu fiel parceiro Casé, o míope. O que faria pra mudar isso? Tinha que conhecer afinal quem era essa bruxa a que todos tinham medo. Precisava pensar...pensar muito.

    Da cela em frente à de Tininha algo se mexeu. Ela parou de andar de um lado pro outro e procurou prestar atenção ao barulho, até constatar que se tratava de um rato. Tininha o chamou e perguntou o que havia acontecido pra ele estar ali e o porque que ele continuava, já que pelo seu tamanho ele podia fugir. Depois de um tempo, o rato explicou-lhe seu terrível problema.

    O ratinho contou que Madame Zizi andava muito feliz nos preparativos de seu casamento com o Marquês Empruado. Contou também que a bruxa gostava verdadeiramente de seu noivo e ao contrário do que as pessoas pensavam, ela era até muito legal. Gostava de modernidades e de limpeza. Costumava transformar a floresta com tudo que existia de melhor no mercado fantasioso.

    Quando faltavam alguns dias para o casório, ela na ânsia de ficar mais bela para o amado, misturou várias poções e com a ajuda de um espelho mágico danificado trocou alguns ingredientes. O tiro saiu pela culatra e ao invés de ficar mais bela, Zizi ficou pavorosa.

    Desesperada, fez vir até ela todos os médicos mágicos que pudessem salvá-la de destino tão amargo. E nada se resolvia.

    A aparência da bruxilda era horrível. Parecia mais uma Madame Esqueleto. E o que diria seu marquês se a visse assim.

    Triste de sua vida, mandou chamar o Dr. Coruja e este tão cheio de sabedoria fez uso de suas magias. De esquelética Zizi ficou pior, surgiram várias cabeças de caveira. E de caveira em caveira, ficou terrífica. Fizeram de tudo, desde novas poções que só iam piorando, até uma foice em quem ela decepava um esqueleto e surgia outro.

    Irada e sem esperanças, Zizi que não era mais a Madame da Múrcia e sim o Monstro das Caveiras transformou o Dr. Coruja em rato e jurou que enquanto ela não voltasse ao normal, nada seria alterado. Fez também um poderoso feitiço no tempo do reino de seu noivo que o parasse e só voltasse ao normal quando ela adquirisse sua forma e pudessem se casar.

    E assim o rato ficava conjeturando meios e modos de desfazer aquela grande confusão.

    Tininha ouviu a história calada e nada pronunciou. Sua mente que ultrapassava os limites da dislexia, tentava bolar um mega plano para resolver tudo. Apenas perguntou do porque se a bruxa Zizi era boa pras pessoas da floresta, eles viviam tão infelizes e porque ela os explorava?

    O rato nada pode lhe explicar e disse que ainda estava averiguando os fatos. Tininha precisava de tempo pra pensar. Estava com uma batata quente na mão e ia resolvê-la.

    Depois de três dias conversando com o Dr. Coruja/Rato a menina pode captar maiores informações. Pediu que fosse levada até a bruxa infeliz e antes mesmo que chamasse alguém, surgiu um bebê carcereiro e a conduziu até a masmorra onde a horrenda ficava.

    Chegando lá, a bruxa não se mostrou, pois havia ficado com vergonha. Tininha enfim compreendeu que era observada constantemente pela bruxa através da Junkebox e daí soube que nada tinha sido por acaso.

    Por causa sua situação, Zizi havia optado por todas as mentes brilhantes de todos os reinos e como vivia em guerra com o Conde Espinhoso (que havia sido namorado dela), não quis que soubessem de seu estado e muito menos quis enviar o convite aos famosos investigadores. E assim, tramou pra que a brincadeira dela com o amiguinho Casé fossem próximo ao portal que as Letras Impossíveis usavam para saídas estratégicas.

    Tininha ficou surpresa com a revelação, mas lamentou que não pudesse ajudá-la tanto já que ela não era maga e sim uma investigadora. A bruxa ficou arrasada e pôs-se a chorar. Nesse mesmo instante, as milhões de caveirinhas choravam copiosamente fazendo um barulho ensurdecedor.

    Apavorada com a cena, compreendeu do porquê o rato ficar na masmorra. Como pensar com tantas cabeças chorosas?

    Uma lâmpada se acendeu em sua mente e ela perguntou a bruxa qual era o produtor das poções e também o motivo para explorar o povo da floresta. A bruxa surpresa, afirmou que deixara o povo sem recursos sim, mas que nada pedia a eles. Na verdade, nem prestava atenção dada à sua preocupação com seu visual tão feio.

    Depois de xeretar aqui e ali, Tininha chegou ao espelho danificado e olhou na parte de trás. Todos os objetos mágicos pertenciam ao mercadomagico.com e ela quis averiguar de quem era o site. Procuraram por longo tempo, até constarem que o site pertencia a um ex-noivo da bruxa antes sedutora. E a resposta se fez.

    Zizi quando era mil anos mais jovem, gostava de namorar um e outro porque era bela. Numa dessas muitas arrasadas de coração ela encantou um príncipe sapo de um reino muito, muito distante e como não quis se casar, ele prometeu que ela não se casaria com ninguém. Esse príncipe viscoso, herdeiro de grandes fortunas comprou o site que ele sabia ser o predileto da ex-noiva bruxilda e arquitetou o plano que seria triunfal quando desse certo.

    Por ser deveras vaidosa, ela nem se deu conta que o espelho era programado para ensinar-lhe poções invertidas. Cada vez que utilizasse a coisa ficaria pior. Depois de muito conversar com a bruxa e o rato, foi decidido que eles enganariam o espelho e fariam o feitiço inverso.

    Eureca! Foi o que respondeu o Dr. Coruja quando viu a bruxa bela voltar sua forma e ele voltar a seu corpinho rapinoso. Muitas bênçãos e alegrias foram pronunciadas. A bruxa quebrou o encanto de tristeza e de sujeira que seu povo havia recebido através dos produtos do mercadomagico.com e já de volta a sua beleza, tratou de voltar ao movimento seu noivo e todos da Múrcia.

    Eram momentos felizes. Tininha havia dado o buquê da noiva e acompanhava os votos do mago Poseidon no casório da Bruxa Zizi e de seu noivo O Marquês Empruado. Todos os animais haviam sido convidados e estavam em festa. A floresta resplandecia. Era hora de voltar pra casa. Tininha então, tropeçou no buraco do tatu e voltou pra Espinhela caída.

    Todos foram felizes para sempre. Menos a bruxa Zizi e seu noivo o Marquês Empruado, porque a bruxa tinha um gênio do cão.

    FIM


    Moral da História: A tradição oral nos mostra que desde que o mundo é mundo o homem sonha e passa adiante aquilo que vê e acredita. Nossos valores, dotes culturais e aprendizado nos fez diferenciar o real do imaginário.
    Essa história que coabitou meu cérebro e que agora passo adiante são fragmentos da menina que fui e da mulher que sou.
    Todos nós temos nossos dons, nossas virtudes e defeitos. Acho que não preciso citar que muitas vezes seguir o exemplo da bruxa vaidosa é furada...rs
    Bem, é isso. Espero que mesmo brigando muito, a Zizi esteja curtindo seu casamento com o seu Marquês e que me apresentem muitas outras para dançarem juntas em minha mente e em meus sonhos.

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  5. Desafio I

    26/02/2008

    Tema: Lenda

    Prazo para postagem: 26/02 até 11/03.

    Votação: 12/03 até 18/03
    Acordem e progresso!

    Carlito Maia