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  1. Foto final

    20/09/2012


    Clic

    Espocou o flash. A luz branca e forte me deixou momentaneamente desnorteada. Eu estava ali me sentindo desnudada pela série de clics e flashes que o homem por trás da câmera fazia de cada ângulo meu.

    E eu ali, sem poder me mexer, apenas me sentindo envergonhada por estar sendo fotografada. Não sei nem mesmo como fui parar ali, mas quando tento pedir para que as fotos parem, todos me olham como se não me vissem. E continuo ali, choramingado sem ser ouvida. Até que meus soluços cessam e só me sinto suspirar.

    O fotógrafo conversa com outro homem que apenas balança a cabeça e aponta para mim como se mostrasse o que mais deve ser fotografado.

    Aquela noite parece interminável e já vejo os veios roxos e rosas do amanhecer surgindo no céu. Talvez agora eles me deixem em paz e parem com as fotos. Mais alguns flashes das minhas pernas, dos meus braços, do meu tronco e do meu rosto. Algumas fotos tão próximas que sinto a respiração do fotógrafo esquentar minha pele fria do sereno.

    Então tudo para. A conversa que ouço dos homens ao meu redor, os flashes da máquina fotográfica que me incomodam e até o tempo parece parar. Uma luz forte me cega e percebo que não é o flash da máquina, pois ela se mantém forte e parece não apagar. Uma sombra se aproxima com um pano enorme nas mãos e me cobre totalmente. Então não vejo mais nada, não ouço mais nada e não sou mais ninguém: apenas um corpo atirado numa viela qualquer.

  2. 4 comentários:

    1. nossa, q coisa tenebrosa! parece um "estupro fotográfico"!

      vou ter que ler isto novamente pra tentar entender melhor seus significados... bem, de todo modo foi bem impactante!

    2. Vivi disse...

      Profundo...Você enfocou o tema para além da máquina fotográfica entendida como um dispositivo técnico. Achei bacana trazer, ao primeiro plano, a técnica do ato de fotografar. Só que sob um aspecto diferente e sinistro. O que se vê é a técnica fria e indiferente pairando acima da circunstância funesta que ali se desenrola. Como já disse, um texto profundo, inteligente, chocante e bom de se ler.

    3. disse...

      Gosto de textos que parecem uma coisa no inicio, mas, ao final, a história se revela de forma surpreendente.
      O texto é forte e evoca no leitor sentimentos que, por vezes, deixamos de lado por mostrar o lado frio e cruel do ser humano. Muito interessante a abordagem, Medéia.

    4. Lyani disse...

      Realmente muito profundo Medéia! Fiquei sem ar, e mais uma vez senti a crítica implícita e tudo no seu texto era sentidos. Adorei! Parabéns :)