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O Menino
22/09/2008
(repente)
Por Fernanda Soares
Num dia de primavera,
Belo e cheio de cor,
Entrava o menino em casa
Com olhos marcados de dor.
Seu corpo era franzino
Típico da pouca idade
Queria ser homem forte
Pra disfarçar a orfandade.
Vivia a brincar com todos
E traquinagens fazia
Ria-se todo garboso
Quando alguém lhe descobria.
Mais nesse dia não ria
E de tristeza se amofinava
Quando voltava pra casa
O pesar continuava.
Sua alegria se fora
Como o bater de asas ligeiras
Sentia-se arrasado
Pela verdade estrangeira.
Que verdade era essa,
Que lhe modificara o humor
Quando soube na escola
A razão de seu temor.
Foi na aula de catecismo
Dito pelo professor
O menino descobriu
Que era um grande pecador.
Mais como podia ser,
Procuraria na bíblia
Pecador porque motivo?
Só causava alegria.
E confuso ficou
Vários dias passaram
O menino tão preocupado
Todos lhe perguntaram.
Porque vives triste menino,
Apaixonado ficou?
Nem mais traquinas és
Será que cresceu ou se adoentou?
E de tantas perguntas
A titia se apiedou e o levou
Debaixo de suas saias com teimosia
O médico o retirou.
Muito cabisbaixo
Respondeu ao doutor
Seu mal era o pecado
Isso só lhe causava dor.
E riu-se o homem
Dada tanta inocência
Explicou-lhe que era pecado de todos
E se satisfez com a nova aparência.
E correu o menino pros campos
Já livre do pesadelo
Não queria saber de mais nada
Nada que fosse constrangê-lo.
E os dias continuavam bonitos
Alegres e primaveris
Às vezes ainda via o menino
Com a bola, sua imperatriz.
E de alegrias se devem
Graças à linda infância
Fase boa e curta,
Que só é atrapalhada pela ignorância.
Esse menino bonito
De tantos beijos da titia
Um dia irá crescer
E terá uma vida sadia.
Daí será mais um pecador
Neste mundo de tanta grandiosidade,
Mal não há de fazer e nem sentir
Mais terá que pecar, pra dar continuidade.
Postado por Fernanda Soares às 15:07 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares | 6 comentários |
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Ilusões
04/09/2008
Por Fernanda SoaresEu sou como qualquer mulher. Por vezes me acho linda e outras vezes tenho medo de sair na rua. Coloco minhas esperanças no próximo presidente e sempre acho que a água não vai acabar nunca. Vivia a vida que todo mundo vive e tudo pra mim era algo superável. Tenho a idade que a maioria de vocês tem e uma vida inteira pela frente...pro meu azar!
Desde os oito anos eu planejo tudo na minha vida. Escolhi a carreira e amigos, só não contava com metabolismo, genética e um corpo que não acompanhava tudo que eu sonhei pra mim. Por isso as incontáveis dietas, malhações, fome e uma perseguição contínua da infeliz gordura localizada na barriga. A necessidade de me livrar dela tornou-se pra mim, a razão do meu viver. E meu viver dizia que só seria feliz se fizesse uma cirurgia.
Cheguei ao local através de uma colega de academia que havia feito uma correção plástica no rosto, uma extração de um sinal na ponta do nariz. Ela me dissera que foi o máximo e que lá era o que havia de melhor. Era um sobrado numa rua bem conhecida. Parecia um local bastante distinto e fiquei muito feliz por ser um local tão lindo. A sala de espera era limpa com sofás novos e tv sofisticada. Estava certa que pela aparência o médico era de renome. A recepcionista era nova e muito educada. Serviu-me cafezinho, revista e depois de uns vinte minutos fui encaminhada para a saleta do cirurgião. O médico parecia de capa de revista, lindo de morrer e me recebeu sorrindo. Parecia um pouco jovem pro cargo, não me importei muito com isso. Só me bastava que me operasse e deixasse todos caídinhos por mim.
Depois de acertar preço, os pequenos cuidados e a melhor forma de pagar, fui feliz e contente pra casa pra que me operasse em dois dias. Nesses dias mal dormi, tamanha ansiedade. Era a realização de um sonho. O sonho de ser uma diva!
Quando cheguei à clínica era tanta a animação que nem prestei atenção nos papéis e tudo mais que assinei. Não prestei atenção no pagamento no ato e muito menos a falta de enfermeiras e outros clientes. E começou minha operação...Começou também minha nova realidade.
Depois de três dias da operação fui enviada pra casa. Meu corpo parecia ter sido socado por mil homens e eu estava toda roxa. Não sei o que houve mais algo tinha saído errado.
Só fui tomar consciência do erro uma semana depois. Tive infecção e me levaram pra um hospital onde sofri uma nova cirurgia. Lá fui informada que a tão sonhada cirurgia plástica, tinha me custado o baço e um pedaço dos rins e minha barriga até tinha sumido como eu sonhava, só que agora ela tinha um buraco do tamanho de uma bola. Decidi voltar à clínica pra exigir que o cirurgião me devolvesse o dinheiro.
Quando enfim tive forças e voltei ao sobrado, nem a placa constava na frente. A sala de espera estava vazia e nem os sofás, tv e recepcionista se exibiam. Parecia que um furacão havia passado levando tudo. Gelada, busquei ajuda...precisava de respostas. Será que se mudaram? O que eu poderia fazer?
Foi difícil compreender que passei por um golpe e dali por diante teria que conviver com aquilo. Seria eternamente vítima da ilusão da beleza a qualquer custo e teria que conviver com a certeza de que me deixei enganar por um bonito picareta que me sorriu e me deixou transparecer que seria o primeiro de muitos dos homens que cairiam aos meus pés.Postado por Fernanda Soares às 21:10 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares | 8 comentários |
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Rainha dos Fantasmas
17/08/2008
De Fernanda SoaresTema: Imagem e textoPeríodo de votação: 18/08 a 20/08Era um fim de semana que prometia ser ensolarado e ele tinha decidido aproveitar o domingo. Afinal, não era todo dia que acordava tão bem disposto e não queria perder essa oportunidade.Toledo era assim por dizer um 'partidão, chegara à meia-idade em perfeita forma e solteiro. Tinha belíssimos olhos azuis, cabelos muito claros e um corpo de deixar a velhinha do 308 de dentadura caída. Não havia uma mulher que não olhasse aquele ex-policial duas vezes. O pior é que ele não dava importância a isso. Era bom aquele homem...Um monumento!Abandonara sua carreira quando seu parceiro morreu em troca de tiros com bandidos em Vigário Geral e dali em diante, pegou pra si a obrigação de sustentar a viúva e os trigêmeos. E assim ele vinha vivendo sua vida como Deus mandava. Por vezes viajava a trabalho, saía com amigos, brincava com os afilhados, consolava sua amiga viúva e mal tinha tempo pra si. Até aquele dia que decidiu dar uma caminhada pelas trilhas da Floresta da Tijuca.A manhã surgiu em todo seu resplendor. Toledo acordou num sobressalto, retirou de cima do peito o livro de Mitologia Celta que estava lendo até tarde na noite passada e havia adormecido segurando. Tomou banho, preparou seu desjejum e foi pegar o metrô para a Tijuca onde se encontra a linha de ônibus que sobe o alto da Boa Vista. Chegou à Floresta, caminhou pelas trilhas e nesta rotina passou o dia todo. De vez em quando, sentava-se para descansar e pensar na vida.Entardeceu e ele nem tinha sentido, pois seu dia estava ótimo. Toda aquela natureza calma estava lhe fazendo bem. Quando já se aproximava o momento de descer, um canto lhe chamou atenção. Aproximou-se pra escutar e observou que além do canto, som de tambores acompanhavam e faziam um verdadeiro barulho entre as matas ...Não resistindo passou a seguir em frente pra descobrir do que se tratava. Ao chegar lá, se deparou com uma cena que jamais esperava encontrar. Ainda mais no Rio de janeiro, parecia cena de filme.O desconcerto e a curiosidade eram intensos. Jamais tinha visto aquilo.Verdadeiras mulheres que mais pareciam ninfas, se agrupavam em volta de um caldeirão em chamas com um altar improvisado e no centro focalizava-se uma verdadeira amazona. Ela não só era linda com aqueles cabelos negros e olhos verdes, como cantava como um rouxinol. Aquela majestosa voz eriçava seus cabelos e a melodia desconhecida completava sua alma.Toledo ficou observando aquela cena, não sabia se era macabra ou divina. Estava hipnotizado por aquelas 'Adoradoras de Macha'. Permaneceu observando-as em seu culto pagão até escutar seu nome. Não acreditava como, mais aquela mulher pedia que se aproximasse...Descoberto de seu esconderijo entre as folhagens, caminhou em direção a aquela criatura metade mulher, metade deusa, e ela lhe disse o quanto sua presença era esperada. Explicou-lhe que ele representaria a essencia masculina, como um macho divino e juntos celebrariam o grande rito. Seriam naquele momento, a encenação ancestral dos amantes que se unem pra benzer a terra. Este ao escuta-la, nem pensou duas vezes dado o seu encantamento. Deixou-se conduzir para o círculo totalmente embevecido. Participou de todo o ritual doando à estranha seu sêmen sagrado.Jamais viu tamanha beleza ou sentiu tamanha necessidade de alguém. Sentia-se enfeitiçado por aquela mulher e levado pela cadência de sua voz chegou a um êxtase total. Naquele local perdido, nada importava. Apenas folhas balançavam...Escutava-se som de bichos...Barulho das águas...tambores e nada mais.Toledo acordou num sobressalto, retirou de cima do peito o livro de Mitologia Celta que estava lendo até tarde na noite passada...Sonhara e sua diva não passava de uma ilusão. Seus dias continuariam escuros e não escutaria aquele maravilhoso canto. Parecia um herói perdido em combate no reino da morte...Macha – Deusa irlandesa venerada nos templos de Emain Macha, em Ulster. Sua voz enfeitiçava os homens nos campos de batalha, atraindo-os para seu escuro reino da morte.Conhecida como a Rainha dos FantasmasPostado por Fernanda Soares às 12:19 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares, Tema X - Imagem e Texto | 7 comentários |
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Uma pequena prece
12/08/2008
Uma pequena prece
por Fernanda Soares
Ai Deus! O que será de mim?
Meu mundo é tão pequeno e tanto tenho a trabalhar !
Minhas irmãs silenciosas seguem em frente
Pra onde ir? O que fazer?
Oh vida difícil!
Sempre fui muito sonhadora, mesmo não tendo muito tempo pra sonhar
Gosto de olhar para o firmamento e ver todo o universo
Lá, eu me imagino muito grande
Neste momento não vejo as luzes cintilantes, ao contrário, vejo o céu todo cinza
O que será que aconteceu?
Minhas anteninhas nada captam
Deve ter uma batalha lá por cima ou estão nos castigando
Porque chove sem parar?
Já sei vou rezar! Mais pra quem?
Será Deus vai escutar minha prece ?
Será que existe um Deus do meu tamanho?
Ah quanto fardo…quantas folhas a carregar!
Continuo em frente junto com minhas irmãs a abrir caminho
E chove…chove…chove sem parar
Meu corpinho pequenino tem formas articuladas pra entrar em tudo que é lugar
Será que a chuva pode me levar ?
E pra onde ?
Não quero ir embora...Não agora quando precisam de mim
Quero ficar com minhas irmãs procurando um local seco pra nossa rainha
E seguimos…seguimos em frente
Eu e toda a minha família
Vejam parou a chuva! – Gritou a guardiã
E festejam as formigas trabalhadeiras
É de novo hora de trabalhar
Eu continuo silenciosa, pensando
Será que Deus me ouviu ou a Guerra acabou?
Não, não deve ser ! Acho que foram as estrelas que quiseram aparecer
Pra mostrarem umas as outras seus vestidos cintilantes
De toda forma eu agradeço porque mesmo daqui de baixo, elas ficam lindas
E eu posso seguir em frente neste meu mundinho tão pequenino
Sonhando que Deus me ouviu
Imaginando-me grande
e seguindo rumo ao meu destino de formiga.Postado por Fernanda Soares às 07:00 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares, Tema IX - Chuva | 6 comentários |
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O Presente
26/07/2008
O Presente
por Fernanda Soares
Gioconda era moça triste. Vivia sempre em casa resmungando a desgraça de sua vida.
Era sempre a mesma história e nada daquilo mudar. Na cidade todos tinham conhecimento do causo da moça rechonchuda que conheceu por carta um homem, montou enxoval pro casório e acabou sem grinalda. Não é que o moço, justo nas vias do enlace, foi se encantar por Anita, sua irmã. A irmã magricela e mais nova de Gioconda, embora muito tímida, até que era engraçadinha e ficou muito feliz com o bonitão do noivo da irmã. E lá se foi ela casar muito satisfeita. Isso foi uma punhalada pra Gioconda. Foi assim, que perdeu o noivo, a festa do casamento e até o enxoval. Pobre Gioconda!
O tempo foi passando e novos acontecimentos na cidade surgindo. Na vida de Gioconda não parecia sair da mesmice. Isso até o dia que chegou uma encomenda pra moça, em nome de sua parenta e madrinha, vinda da capital. Dizem, e não conto pra ninguém quem me contou, que ao abrir a caixa, Gioconda estranhou o conteúdo. Não se sabe o que estava lá dentro ou o sentido do presente e da surpresa. Mais o certo, é que por essas paragens nunca se viu mudança mais drástica.
Se antes, Gioconda era a carola que não saía de casa e vivia a reclamar de sua situação, em pouco tempo algo a transformou totalmente. Com o passar dos dias, começou-se a sentir um sedutor perfume que zombeteava dos curiosos a cada vez que a gordota descia a rua principal. E pra espanto de toda uma população, a moça começou a marcar ponto no coreto onde todas as mocinhas iam se mostrar, de vestido novo e batom vermelho. Não satisfeita, compareceu a todos os bailes oferecidos pelas melhores famílias da região dançando com todos os rapazes disponíveis e foi assim que em menos de dois meses, o furacão da cidade recebeu de um dos maiores fazendeiros da região, a benção do pedido. Mais pra frente, deu-se o enlace com toda pompa e circunstância.
Por muito tempo não se soube como, quando e porque um singelo presente pôde fazer tamanha balbúrdia. Que ela não era mais a mesma pessoa...ahhh isso não era não! E assino e afirmo com carimbo e firma reconhecida em cartório, que presenciei a felicidade da mocinha ao lado de seu fazendeiro e de mais tanta ajuda que ela deu pra cidade e até pra esse contador que vos fala. Tenho certeza que com mais tantos outros, ela e seu amado repartiram suas venturas.
Muitos anos depois, que fui saber o que continha naquela caixa. E como não consigo segurar os dedos e muito menos a língua, passo adiante esse fato. Só que se vierem tirar satisfações a cerca desta bisbilhotice, eu nego e ainda peço o perdão a Deus e a nosso Senhor Jesus Cristo que há de descer do reino dos céus um dia. Amém!
Ao abrir o presente, a senhorita em questão e formosura, teve a primeira surpresa em ver um espelho antigo, que segundo ela estava na família pra mais um século. O mesmo tinha em sua moldura os seguintes dizeres: “Faça de você, um espelho que reflita a sua alma e transforme a sua vida em ações”...e onde já se viu um espelho conter isso? Segundo as explicações de comadre Gioconda, essa inscrição no espelho mais a própria imagem refletida a fez pensar em toda a sua vida e em sua infelicidade. O perfume que chamava-se “ Possibilidades” deu a ela o impulso da vontade de estar bonita e fazer algo por si mesma pra sair daquele ostracismo em que ela tinha se metido. A carta escrita por sua madrinha, contava a história de uma outra moça que também passara por dificuldades e como ela se saiu em seu drama.Isso fez Gioconda se encher de esperança. Passando a ter noção do que é o verdadeiro amor-próprio, sentimento esse de orgulho pessoal que nos leva a não querer desmerecer e muito menos deixá-lo escapar novamente. E isso ela não queria que acontecesse de novo. O principal nessa história toda, foi o tamanho poder que o presente gerou nela, fazendo-a adquirir coragem pra se jogar no mundo.E foi assim, que ela decidiu dar ênfase aos detalhes do presente e seguir adiante sem olhar pra trás. Porque a vida é muito curta e seria uma perda de tempo deixar de viver outros causos, porque as primeiras tentativas não deram certo.
Hoje, Gioconda vive na mesma cidadezinha e sua casa está sempre cheia de música, jovens e um cheirinho bastante adocicado de felicidade.E você anda triste? Que tal deixar seu endereço? Quem sabe não está precisando receber um presente? Quem sabe esse presente não está aí já na sua caixa de correio? Vá dar uma olhada e se abra pro novo ou então se encha da mesma coragem de comadre Gioconda e vá se olhar no espelho. Será que está refletindo a imagem que você gostaria? Será que é essa imagem que você quer mostrar ao mundo? Eu até posso dar palpite, mais quem sabe mesmo é só você.
Continuarei por aqui esperando pra contar pro meu povo sua história. Se não quiser tudo bem, eu vou contar do mesmo jeito. E não foi pra isso que Deus me fez? Não consigo fazer outra coisa!hahaha...mais aí já é outra história!
Até mais, se assim tiver que ser!Postado por Fernanda Soares às 04:41 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares, Tema VIII - Espelho | 5 comentários |
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O Desfile
02/04/2008
O Desfile
Por Fernanda Soares
Um imenso clarão inundava as retinas até pouco a pouco se ver em total escuridão
Ao longe se ouvia um bumbo agonizante...tum...tum...tum
O som de choro se misturava a burburinhos e bocejos. Como num funesto e melodioso desfile carnavalesco.
A comissão de frente formada de glóbulos vermelhos e brancos, se degladiavam até sumirem em caudaloso rio sanguíneo.
Os rins iniciavam junto ao fígado e o pâncreas uma vingativa parada. Todos magistralmente sincronizados como verdadeiros carros alegóricos.
Junto a eles, montavam guarda os intestinos em complexa dança para impedir uma maior movimentação
Todos a espera de notícias das regiões superiores
A vesícula gritava e gritava assustada sem saber a quem temer
O estômago como num campo de guerra devastava-se entre ácidos, sucos e dejetos
Estranhos espasmos calorentos e febris dominavam em todas as regiões
Nada se sabia e era assustador!
Os neuro-transmissores não haviam conseguido enviar as informações aos outros pelotões e nem aos chefes de alas
As células não estavam se importando com a harmonia e nem a rainha conseguia fazer sua parte, tentar conduzir a bateria a um desfile fabuloso
Reinava o mais perfeito caos entre membranas, tecidos e ossos que gingavam frouxos como passistas em dias de desfile
O coração havia perdido seu compasso e as artérias se entupiam chorosas, lamentando o herói morto
O cérebro sofria enormes transtornos de consciência, mais continuava a trabalhar com a mesma leveza de um mestre-sala até que não aja mais necessidade e todos se reúnam pra posarem pras fotos da autópsia
Já neste momento, livres dos efeitos da pouca quantidade do formol, os milhões de vermes destacados começam sua limpeza pra darem lugar a novos desfiles
Nas dimensões extrafísicas aparelhos iam sendo desligados a medida que o laço fluídico se desprende e a essência vai se afastando do invólucro terreno no término de sua missão
Um distinto balé vai fazendo corpo no astral. Milhões de luzes se aglutinam junto aquele casulo terreno já extinto, saudando a pura essência em sua nova morada...são como a calorosa platéia que aplaude o ser que completou sua missão no imenso sambódromo da vida.
As estrelas cintilantes recebem aquele que retorna para um dia voltar de novo e completar a dança cósmica iniciada desde o início dos temposPostado por Fernanda Soares às 10:31 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares, Tema II - Ciência | 5 comentários |
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As Aventuras de Tininha e Casé na Terra da Espinhela Caída
Episódio: ‘ Tininha e a Bruxa Zizi – A Futura Madame da Múrcia’
Por Fernanda Soares
Na terra da Espinhela Caída tudo vive ao avesso. Tininha a menina disléxica se perde de Casé o seu amiguinho míupe metendo-se na maior confusão. Tudo porque caiu no buraco das Letras Impossíveis – As mega espiães das crianças que não gostam de ler.
Depois de tanto cair, Tininha se depara com um grande casulo. Era a casa da aranha desesperada. Ela gritou e gritou e gritou até Tininha compreender que aquele lado da Espinhela era mais caída do que ela imaginava.
Caminhou muitas horas e quando já estava cansada, deparou-se com uma imensa folha que tomava sol na beira do rio. Quando se aproximou, a folha tentou fugir e Tininha a alcançou forçando-a a levá-la para o outro lado. A folha então, depois de muito alertá-la sobre os perigos do lado de lá a transportou.
Chegando do outro lado, a menina disléxica se depara com a mata mais fechada que já viu em toda sua vida. Seu estômago roncou tão alto que os esquilos que por lá transitavam se assustaram e acabaram caindo no buraco do tatu. Tininha só não sabia dizer se estava com fome, medo ou dor de barriga de tanto comer o doce da vovó. Continuou sua caminhada mata adentro, pois tinha certeza que em terras como aquela, com certeza por ali alguém habitava. Tininha estava certa. Aquela floresta, aquelas habitações e todo aquele reino pertenciam a malévola Bruxa Zizi – A Futura Madame da Múrcia. Rezava a lenda que a Bruxa Zizi vinha de uma família de Sacerdotisas do mal e que por um feitiço mau feito havia caído na Múrcia e de lá transitado para as Terras da Espinhela Caída. Por muitas eras ela havia tentado tomar a Espinhela com intenção de unificar a Múrcia, terra de seu noivo ‘O Marquês Empruado’. Com muito esforço e ajuda de muitos amigos, o Conde Espinhoso havia conseguido banir Zizi para a Floresta do Mato sem Cachorro. E lá estava Tininha no reino da Dona Bruxilda Zizi. Ela apenas se preocupava se o termo bruxa significava algo mesmo ou não passava de brincadeira.
A menina se aproximou de uma tapera e lá de dentro escutou alguém praguejar. Se aproximando, pode perceber que o morador era tão pequeno quanto ela. Tentou chamar e depois de muito estardalhaço foi atendida por um menininho muito sujinho. Esse menino explicou-lhe que ali não era como a Espinhela, que na Floresta do Mato sem Cachorro as pessoas não eram felizes mesmo que lá as coisas não fossem do avesso. Lá era tudo nos conformes, mas as pessoas viviam tristes, sujas, com fome e que o pouco que conseguiam tinham que pagar para Zizi, a Bruxa. Tininha ficou tão revoltada que até esqueceu que precisava de um caminho para voltar a Espinhela Caída.
Refez-se da fome que estava sentindo com algumas raízes que as formigas e os esquilos haviam a ensinado tirar da terra, despediu-se do menino e seguiu floresta a baixo. No caminho, Tininha sentiu falta de Casé e lamentou a brincadeira dos dois no buraco das Letras Impossíveis. Se elas descobrissem que eles andaram mexendo em seus equipamentos ultra-secretos estavam fritos.
Conforme andava, se deparava com alguém e escutava sua história, mais se revoltava. Estava doida para ver essa tal de Bruxa Zizi.
Mal sabia ela, que a megera acompanhava todos os seus passos pelo junkebox que havia comprado no mercadomagico.com e que a cada passo em suas terras, o aparelho repetia em música tudo que ela estava fazendo.
Música vai e música vem. Tininha chegou ao centro da Floresta e se espantou com os avanços tecnológicos que a Bruxa Zizi havia colocado ali. Taperas com aparelhos de som e comunicação, relógios avançados e toda a sorte de quinquilharias mágicas que se podia imaginar.
De fato, era tudo muito estranho. Não se via ninguém feliz e tudo parecia tão sujo.
Nesse meio tempo, um bebezinho se aproximou e falou que estava presa a mando da Madame Bruxa. Tininha primeiro pensou em rir. Quem em sã consciência era preso por um bebê? Só se deparou com a verdade quando apareceram mais bebês e estes a escoltaram. Tininha ia correr, mas alguém sussurrou lá de dentro que não fizesse isso, porque a fralda dos bebês tinha um poderoso veneno de causar nojo.
Caminhou calada até o interior do castelo de Zizi. Tinha que arrumar um jeito de sair daquele lugar e libertar as pessoas da floresta. Só não sabia como!
Uma escuridão tomava conta do recinto em que Tininha foi posta, quer dizer, foi trazida calmamente por carcereiros de fraldas. Ela estava com um humor daqueles! Como podia ser pega por situação tão ridícula? Afinal, Tininha a menina disléxica era famosa em desvendar casos com seu fiel parceiro Casé, o míope. O que faria pra mudar isso? Tinha que conhecer afinal quem era essa bruxa a que todos tinham medo. Precisava pensar...pensar muito.
Da cela em frente à de Tininha algo se mexeu. Ela parou de andar de um lado pro outro e procurou prestar atenção ao barulho, até constatar que se tratava de um rato. Tininha o chamou e perguntou o que havia acontecido pra ele estar ali e o porque que ele continuava, já que pelo seu tamanho ele podia fugir. Depois de um tempo, o rato explicou-lhe seu terrível problema.
O ratinho contou que Madame Zizi andava muito feliz nos preparativos de seu casamento com o Marquês Empruado. Contou também que a bruxa gostava verdadeiramente de seu noivo e ao contrário do que as pessoas pensavam, ela era até muito legal. Gostava de modernidades e de limpeza. Costumava transformar a floresta com tudo que existia de melhor no mercado fantasioso.
Quando faltavam alguns dias para o casório, ela na ânsia de ficar mais bela para o amado, misturou várias poções e com a ajuda de um espelho mágico danificado trocou alguns ingredientes. O tiro saiu pela culatra e ao invés de ficar mais bela, Zizi ficou pavorosa.
Desesperada, fez vir até ela todos os médicos mágicos que pudessem salvá-la de destino tão amargo. E nada se resolvia.
A aparência da bruxilda era horrível. Parecia mais uma Madame Esqueleto. E o que diria seu marquês se a visse assim.
Triste de sua vida, mandou chamar o Dr. Coruja e este tão cheio de sabedoria fez uso de suas magias. De esquelética Zizi ficou pior, surgiram várias cabeças de caveira. E de caveira em caveira, ficou terrífica. Fizeram de tudo, desde novas poções que só iam piorando, até uma foice em quem ela decepava um esqueleto e surgia outro.
Irada e sem esperanças, Zizi que não era mais a Madame da Múrcia e sim o Monstro das Caveiras transformou o Dr. Coruja em rato e jurou que enquanto ela não voltasse ao normal, nada seria alterado. Fez também um poderoso feitiço no tempo do reino de seu noivo que o parasse e só voltasse ao normal quando ela adquirisse sua forma e pudessem se casar.
E assim o rato ficava conjeturando meios e modos de desfazer aquela grande confusão.
Tininha ouviu a história calada e nada pronunciou. Sua mente que ultrapassava os limites da dislexia, tentava bolar um mega plano para resolver tudo. Apenas perguntou do porque se a bruxa Zizi era boa pras pessoas da floresta, eles viviam tão infelizes e porque ela os explorava?
O rato nada pode lhe explicar e disse que ainda estava averiguando os fatos. Tininha precisava de tempo pra pensar. Estava com uma batata quente na mão e ia resolvê-la.
Depois de três dias conversando com o Dr. Coruja/Rato a menina pode captar maiores informações. Pediu que fosse levada até a bruxa infeliz e antes mesmo que chamasse alguém, surgiu um bebê carcereiro e a conduziu até a masmorra onde a horrenda ficava.
Chegando lá, a bruxa não se mostrou, pois havia ficado com vergonha. Tininha enfim compreendeu que era observada constantemente pela bruxa através da Junkebox e daí soube que nada tinha sido por acaso.
Por causa sua situação, Zizi havia optado por todas as mentes brilhantes de todos os reinos e como vivia em guerra com o Conde Espinhoso (que havia sido namorado dela), não quis que soubessem de seu estado e muito menos quis enviar o convite aos famosos investigadores. E assim, tramou pra que a brincadeira dela com o amiguinho Casé fossem próximo ao portal que as Letras Impossíveis usavam para saídas estratégicas.
Tininha ficou surpresa com a revelação, mas lamentou que não pudesse ajudá-la tanto já que ela não era maga e sim uma investigadora. A bruxa ficou arrasada e pôs-se a chorar. Nesse mesmo instante, as milhões de caveirinhas choravam copiosamente fazendo um barulho ensurdecedor.
Apavorada com a cena, compreendeu do porquê o rato ficar na masmorra. Como pensar com tantas cabeças chorosas?
Uma lâmpada se acendeu em sua mente e ela perguntou a bruxa qual era o produtor das poções e também o motivo para explorar o povo da floresta. A bruxa surpresa, afirmou que deixara o povo sem recursos sim, mas que nada pedia a eles. Na verdade, nem prestava atenção dada à sua preocupação com seu visual tão feio.
Depois de xeretar aqui e ali, Tininha chegou ao espelho danificado e olhou na parte de trás. Todos os objetos mágicos pertenciam ao mercadomagico.com e ela quis averiguar de quem era o site. Procuraram por longo tempo, até constarem que o site pertencia a um ex-noivo da bruxa antes sedutora. E a resposta se fez.
Zizi quando era mil anos mais jovem, gostava de namorar um e outro porque era bela. Numa dessas muitas arrasadas de coração ela encantou um príncipe sapo de um reino muito, muito distante e como não quis se casar, ele prometeu que ela não se casaria com ninguém. Esse príncipe viscoso, herdeiro de grandes fortunas comprou o site que ele sabia ser o predileto da ex-noiva bruxilda e arquitetou o plano que seria triunfal quando desse certo.
Por ser deveras vaidosa, ela nem se deu conta que o espelho era programado para ensinar-lhe poções invertidas. Cada vez que utilizasse a coisa ficaria pior. Depois de muito conversar com a bruxa e o rato, foi decidido que eles enganariam o espelho e fariam o feitiço inverso.
Eureca! Foi o que respondeu o Dr. Coruja quando viu a bruxa bela voltar sua forma e ele voltar a seu corpinho rapinoso. Muitas bênçãos e alegrias foram pronunciadas. A bruxa quebrou o encanto de tristeza e de sujeira que seu povo havia recebido através dos produtos do mercadomagico.com e já de volta a sua beleza, tratou de voltar ao movimento seu noivo e todos da Múrcia.
Eram momentos felizes. Tininha havia dado o buquê da noiva e acompanhava os votos do mago Poseidon no casório da Bruxa Zizi e de seu noivo O Marquês Empruado. Todos os animais haviam sido convidados e estavam em festa. A floresta resplandecia. Era hora de voltar pra casa. Tininha então, tropeçou no buraco do tatu e voltou pra Espinhela caída.
Todos foram felizes para sempre. Menos a bruxa Zizi e seu noivo o Marquês Empruado, porque a bruxa tinha um gênio do cão.
FIM
Moral da História: A tradição oral nos mostra que desde que o mundo é mundo o homem sonha e passa adiante aquilo que vê e acredita. Nossos valores, dotes culturais e aprendizado nos fez diferenciar o real do imaginário.
Essa história que coabitou meu cérebro e que agora passo adiante são fragmentos da menina que fui e da mulher que sou.
Todos nós temos nossos dons, nossas virtudes e defeitos. Acho que não preciso citar que muitas vezes seguir o exemplo da bruxa vaidosa é furada...rs
Bem, é isso. Espero que mesmo brigando muito, a Zizi esteja curtindo seu casamento com o seu Marquês e que me apresentem muitas outras para dançarem juntas em minha mente e em meus sonhos.
®Todos os direitos reservadosPostado por Fernanda Soares às 12:09 | Marcadores: Autora-Fernanda Soares, Tema I - Lenda | 12 comentários |